Distorções de narrativas, fontes e fatos históricos se tornam corriqueiras no cenário político brasileiro
Por Wilson de Oliveira Neto, historiador
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Diz um ditado popular que uma imagem vale mais que mil palavras. Especialmente quando se trata de fotografias. Nada mais ultrapassado, pois, há muito tempo, o realismo fotográfico foi contestado, especialmente, após o surgimento da fotografia digital. Na era das notícias falsas e do distorcionismo, devemos ir além do visível nas imagens visuais, principalmente quando possuem conteúdos controversos ou sensíveis.
Um conhecido publicou em uma rede social um texto sobre o nazismo em Santa Catarina. Um texto “político”, diga-se de passagem, com um certo teor antifascista. Até aí, tudo bem, porque não sou fascista. Porém, na ânsia de garantir likes e engajamentos, ele tratou o assunto de forma muito descuidada ao ponto de reproduzir uma fotografia cujos significados atribuídos são falsos.
Mastro
Fachada – Nela, aparece uma construção em Art Déco, na qual é possível ler em sua fachada “Santa Catarina”. No alto da edificação, um mastro em que a bandeira nacional está hasteada. Em frente, destaca-se a bandeira nazista tremulando em um grande mastro. Meu amiguinho não teve dúvidas e, em letras maiúsculas, escreveu “SEDE DO GOVERNO EM SC COM BANDEIRA NAZISTA”.
Vou ser direito: o significado atribuído ao retrato está errado! Essa fotografia e seu contexto já foram analisados por historiadores, entre os quais René Gertz, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), que a situaram corretamente no tempo e no espaço. Gostem ou não, ela não tem nada a ver com a sede do governo catarinense, muito menos com o nazismo no Estado.
Segundo apurou o colega Rafael José Nogueira, trata-se do pavilhão de Santa Catarina que funcionou durante a Exposição Farroupilha, em 1935, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Foi um evento em comemoração ao centenário da Guerra dos Farrapos (1835/45) e que deu origem ao icônico Parque Farroupilha.
Alemanha
Participantes – Participaram os Estados da federação, cujos pavilhões foram construídos ao longo da Alameda (ou Avenida) das Nações, cuja extensão foi decorada com as bandeiras dos países que foram convidados para a exposição, entre os quais a Alemanha. Em 1935, a bandeira oficial desse país era a bandeira do Partido Nazista.
Esclarecido o conteúdo da fotografia, é necessário constatar que, mais uma vez, a vontade de lacrar fez com que a história pagasse a conta. Infelizmente, distorções de narrativas, fontes e fatos históricos se tornam corriqueiras no cenário político brasileiro. Perde o conhecimento e, principalmente, perde a democracia.
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