A PARTIR DO SÉCULO XXI, NÃO VIVEMOS MAIS UMA MUDANÇA
“Reaparecer acima da morte, como insubmersível, há algo de impossível misturado a essas realidades. Daí o indizível” (Victor Hugo)
Por Mauro Cesar Telesphoros Stiegler, psicólogo clínico
A desagregação do regime soviético e dos regimes do leste europeu em meados do século XX nos dão ideia de uma certa consolidação das utopias de sociedade. Regimes como o fascismo, o comunismo e mesmo o nazismo (embora haja a força da ideia no bojo de agrupamentos que mantêm os ideais citados), fragmentam-se na ideia de blocos “neos”, mas longe da genuinidade dos seus fundamentos.
Valores universais que até então centravam-se no indivíduo, seja no aspecto social ou fundamentalmente individual, foram aos poucos substituídos pelos valores tecnocêntricos, estes últimos, fomentadores do tecnológico em si, enquanto ferramenta de consumo e de interação, demonstrando-se realmente como uma revolução alcançada e palpável no mundo.
FUGAZES – A partir do século XXI, nota-se que (principalmente a partir do ano de 2015 até 2023) não vivemos mais uma mudança, entendendo mudança como um fenômeno capaz de ser apreendido e absorvido pelo indivíduo, mas sim uma mutação, uma virada de chave com percepções de “velocidade da luz”, que, ao mesmo tempo que encanta, assusta.
O valor pessoa, no sentido afeto, parece se igualar ou até perder em importância para o valor virtual. Esse virtual contempla “redes sociais”, “aplicativos diversos”, “inteligência artificial e suas quase infinitas possibilidades”, sendo todos esses valores virtuais, ferramentas que possibilitam experiências imediatas e de certa forma reais, ao mesmo tempo líquidas, fugazes, que se derretem na mesma ou até maior velocidade que a própria dimensão virtual propõe.
DIMENSÃO VIRTUAL – Mesmo sendo de certa forma cedo para afirmar categoricamente a presença de um adoecimento sociopsicológico que veio de carona com a mutação, se torna visível a perda ou escassez da subjetividade das relações humanas, sobretudo no campo dos afetos.
A conquista, o charme, a sedução instigante, são substituídas pelo sexo virtual, com “nudes” e orgasmos que se dão em camas distantes. Quando chega o momento do encontro presencial, há pouco o que se conversar, no entanto a possibilidade de uma pobreza na erotização se torna ameaçadora, carecendo de estímulos químicos dos mais variados para que seja possível a concretização de uma relação sexual que já teve uma porcentagem esgotada na dimensão virtual.
O maravilhoso da mutação, especialmente na dimensão virtual, sem dúvida nos traz nuances de um super-humano. Estamos em vários lugares ao mesmo tempo, conversando diferentes assuntos, com pessoas distantes fisicamente, em fração de segundos, algo jamais pensado, a não ser na ficção, que já não é mais tão ficção assim.
DESLIZE – Quando começamos a estudar de perto a revolução da mutação, tendo em vista a nanotecnologia, a manipulação genética, as clonagens e outras experiências biológicas, por exemplo, percebemos que talvez o Frankestein de Mary Shelley já seja uma eventual possibilidade. E o que fazer com isso?
Bom, sendo uma temática abrangente por demais, pretendo tratar dela na próxima coluna ainda, mas é certo que o que tinha ares de ser um ponto de partida controlado em direção à liberdade, pode ser também um deslize para uma patologia nova, porém catastrófica e incontrolável.
É preciso sobretudo não esquecermos que somos humanos, e aí reside o verdadeiramente maravilhoso.
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