Em um ambiente politicamente polarizado, parte da opinião pública, especialmente nas redes sociais, já tomou seu lado e passou a vilanizar o País
Por Wilson de Oliveira Neto, historiador
No último sábado (13), o Oriente Médio renovou a atenção pública com a ofensiva militar do Irã contra Israel, por meio de um ataque com mísseis e munições vagantes (erroneamente denominadas “drones kamikazes ou suicidas”). Segundo o governo israelense, 99% do ataque foram rechaçados pelas defesas antiaéreas do país.
Em um ambiente politicamente polarizado, parte da opinião pública, especialmente nas redes sociais, já tomou seu lado e passou a vilanizar o Irã, inclusive, com citações do Antigo Testamento. Mas, o que é a República Islâmica do Irã? Como ela surgiu? E, quais são suas relações com o Brasil?
Dinastia Pahlavi
Substituído – Entre 1925 e 1979, o Irã (ou Pérsia) foi uma monarquia governada pela dinastia Pahlavi, sendo Reza Xá Pahlavi (1878-1944) seu primeiro rei. Ele foi sucedido pelo Mohammad Reza Xá Pahlavi (1919-1980), que foi coroado em 1941, sendo o segundo e último monarca do Irã.
Inicialmente, a dinastia governou como uma Monarquia Constitucional com um caráter modernizador e ocidental. Porém, a partir de 1953, ela se tornou uma Autocracia – uma “ditadura”, como estamos acostumados a chamar esse tipo de regime político.
“O golpe de 1953 fez que os iranianos vivessem durante 26 anos sob um regime brutal”, afirma Osvaldo Coggiola, no livro “A Revolução Iraniana”. De acordo com esse historiador, além da violência política, a ditadura de Mohammad Reza Xá Pahlavi “aumentou o fosso entre a classe dominante e a maioria pobre da população”. Foi o reinado corrupto e, a partir da década de 1960, anticlerical.
Movimento revolucionário
Baralho – A Revolução Iraniana é o nome dado ao movimento político/popular ocorrido entre 1978 e 79 que resultou na deposição de Mohammad Reza Xá Pahlavi, bem como da abolição do regime monárquico.
Inicialmente, o movimento revolucionário teve um caráter de classe e popular, sendo liderado por uma composição formada pela esquerda, pelos liberais e religiosos muçulmanos. “A revolução democrática esboçava transformar-se em revolução proletária”, explica Coggiola. No início da revolução, o famoso aiatolá Khomeini era uma carta fora do baralho.
Mulás militantes
Clero xiita – Porém, quando do seu retorno do exílio na França, em 01 de fevereiro de 1979, o aiatolá Ruhollah Musavi Khomeini (1902-1989) foi decisivo para a queda da Monarquia e do estabelecimento de uma República Islâmica.
A revolução foi vitoriosa em 11 de fevereiro, sendo a República Islâmica considerada como uma república do povo. Contudo, se inicialmente ela teve uma dimensão democrática-liberal, o clero xiita se tornou hegemônico, especialmente, a partir de dezembro de 1980, quando foi instituída no Irã a Lei Islâmica (Sharia).
“Os mulás militantes estavam em melhor posição para dirigir a revolução, pois eram a única força com intenções políticas definidas, organização e uma estratégia prática. Em 1o de abril [de 1981] Khomeini obteve uma vitória arrebatadora em um referendo nacional no qual as pessoas tinham uma simples escolha – República Islâmica: ‘sim’ ou ‘não’” esclarece Osvaldo Coggiola. Surgia o Irã que com o qual entramos em contato por meio da imprensa e, principalmente, da indústria cultural dos Estados Unidos.
Relações diplomáticas
Brasil – O Brasil e o Irã mantêm relações diplomáticas desde 1907. A Embaixada iraniana foi a primeira a ser instalada em Brasília, quando da sua inauguração, em 1960. Segundo dados do início do ano, o comércio com o Irã representa 1,03% das exportações brasileiras, sendo os produtos primários do agronegócio (grãos, farelos, carne bovina, açúcar e tabaco) os seis principais itens de exportação do Brasil para o Irã.
Em contrapartida, as compras desse país o situam na 70a posição do ranking das importações brasileiras, sendo a ureia em solução aquosa o principal item adquirido. Trata-se, portanto, de uma relação superavitária.
Caricaturizado
Mídia – Devido à suas relações, principalmente, com os Estados Unidos, a partir da década de 1980, o Irã passou a ser caricaturizado pela mídia, especialmente, pela indústria cultural. No Brasil, xiita se tornou sinônimo de fanatismo ou de uma extrema ortodoxia, seja ela política ou religiosa. Nada mais equivocado, pois apesar dos pesares, o Irã é muito mais que isso.
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