qualquer obra literária que se preze usa de suas ferramentas para contar uma história
Por Guillerme Slominsky

a literatura é uma das formas de arte mais antigas e consiste do fazer artístico usando das palavras, trocando, juntando-as e brincando com seus sentidos. qualquer obra literária que se preze usa de suas ferramentas para contar uma história, seja de forma oral ou escrita. foi a literatura que nos concedeu o conhecimento que temos hoje sobre culturas antigas e suas lendas, histórias e tradições.
independente do conteúdo, uma obra tem um modo de contar a história em foco, por meio da narração em forma de frases, versos, diálogos, reflexões e descrições. é esse contar que deixa a literatura com a função comunicativa e estética, onde combinam-se métodos para dar um ar não-cotidiano para aquele escrito.
deixá-lo com ar de estranheza ou maravilhamento pode despertar mais ainda o interesse de quem lê. essa é a diferença entre a literatura e algum texto não-literário onde apenas se relatam fatos, como uma notícia, por exemplo.
verbal e não-verbal
exploração – a poesia é um gênero literário que utiliza de linguagem verbal e não-verbal para contar uma história ou emitir questionamentos e opiniões por meio da exploração métrica e estética e repetição de sons. isso quer dizer que a poesia foca mais no como dizer do que no que dizer. a musicalidade é uma ótima ferramenta pra destacar um poema.
atualmente, um tipo diferente de poesia tem ganhado espaço. o instapoema (ou instapoetry) difere da poesia tradicional ao valorizar o aspecto comunicacional. são obras feitas para serem lidas e facilmente entendidas e compartilhadas pelos leitores, e, pra isso, abrem mão de algumas características estéticas, como métrica, contagem de sílabas e rimas poéticas.
esse novo estilo de escrita poética, por conta de seu teor “compartilhável” impulsionou o mercado de poemas, com as vendas tendo crescido em 130% em 2018 no País e sendo vinculado como algo que veio para “tirar a poeira da poesia”, trazendo uma relevância que há muito tempo o gênero não via dentro do ramo editorial.


as duas composições acima foram feitas por rupi kaur, uma autora canadense e uma das precursoras da instapoesia;
simplicidade
tabu? – simplicidade não é um tabu em poesia. autores fenomenais como leminski, quintana e nosso amado nandinho usaram em muitas vezes da simplicidade como ferramenta poética. destaco um exemplo de cada, em sequência:
“ameixas
ame-as
ou deixe-as”
(paulo leminski)
“se as coisas são inatingíveis… ora!
não é motivo para não querê-las…
que tristes os caminhos, se não fora
a presença distante das estrelas!”
(mário quintana)
“o poeta é um fingidor
finge tão completamente
que chega a fingir que é dor
a dor que deveras sente”
(fernando pessoa)
mas uma das maiores problemáticas da instapoesia, como é citado neste vídeo sensacional da ficçomos, no youtube é quando a simplicidade é tão abraçada que não sobra nada além… do óbvio.
“é como se cortássemos
frases comuns
em versos”
– chamando de poesia
identificação
real impacto – considerando ainda que a maior parte destes textos batem em tópicos como relacionamentos fracassados, autocuidado e tristezas profundas regadas a hormônios, há uma forte tendência de identificação de um público mais jovem, confortando o coração dos desacorçoados nem que seja por meio de poemas ruins em essência.
é claro que eu não tô dizendo que toda instapoesia é ruim de praxe, mas deixa consigo um questionamento na nossa forma moderna de consumir arte: quando os poemas mais procurados são óbvios, sem subjetividade e sem muito espaço para interpretação, qual o real impacto desse novo nicho para a produção poética moderna?
eu fico por aqui, com meus botões,
e até a próxima!
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