DIEGO ANDRADE: BOLSONARO PRESO, DEMOCRACIA À PROVA E LIÇÕES CONTRA O ESQUECIMENTO

SÃO BENTO DO SUL

Não há qualquer coerência no discurso de perdão

Por Diego Andrade, professor

A prisão de Jair Bolsonaro, embora tardia (e domiciliar), marca um ponto de inflexão na história recente do Brasil. Não se trata apenas da detenção de um ex-presidente, mas do acerto de contas entre o Estado Democrático de Direito e uma figura que, desde o início de sua vida pública, flertou com o autoritarismo, exaltou torturadores, atacou instituições e sabotou sistematicamente os pilares da democracia.

O clamor de seus seguidores por perdão e anistia é, no mínimo, irônico – e, no máximo, perigoso. Essa tentativa de blindagem moral e jurídica nada tem a ver com reconciliação nacional. Trata-se de uma estratégia de sobrevivência política de uma extrema-direita que, acuada, busca transformar criminosos em mártires, golpistas em vítimas e a democracia em inimiga.

Não há qualquer coerência no discurso de perdão bolsonarista. Onde estavam essas vozes quando Lula foi condenado sem provas num processo viciado ou quando Dilma Rousseff foi destituída com uma justificativa ridícula e profundamente machista? Onde estava o apelo à clemência quando os pobres eram alvejados por uma “guerra às drogas” racista ou quando indígenas eram atacados em seus territórios, sob o aplauso do bolsonarismo ruralista?

Tentativa de golpe
8 de janeiro –
A tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 não foi obra do acaso. Foi preparada meticulosamente por uma rede de desinformação, sabotagem institucional e incentivo ao caos, liderada por Bolsonaro e seus asseclas. Não há perdão possível quando a própria democracia esteve à beira do abismo.

A história recente da América Latina nos ensina o preço da impunidade. O Chile demorou décadas para levar Pinochet à justiça. A Argentina só começou a curar suas feridas quando reverteu as leis de anistia e condenou os torturadores da ditadura. O Brasil, infelizmente, ainda sofre os efeitos de sua própria anistia de 1979, que permitiu que torturadores morressem impunes e inspirou uma geração de militares a desprezar a democracia.

“Excessos”
Erro histórico –
Perdão, neste caso, não é nobre. É covarde. É a repetição de um erro histórico. Bolsonaro não é apenas um personagem excêntrico que cometeu “excessos”. Ele liderou um projeto de poder baseado no ódio, na mentira e na violência, um projeto que resultou em mais de 700 mil mortos na pandemia, na destruição da política ambiental, na militarização da máquina pública e na erosão da confiança nas urnas.

A justiça não pode ser seletiva. Não se trata de vingança, mas de responsabilidade. O Brasil precisa olhar para seu passado recente com coragem e punir exemplarmente quem atentou contra o regime democrático. Só assim poderemos construir uma democracia verdadeiramente sólida, onde ninguém, nem mesmo um ex-presidente, esteja acima da lei.

Escolha
Começo –
A prisão de Bolsonaro não deve ser o fim de nada. Deve ser o começo de uma nova era, em que o Brasil finalmente escolha entre civilização e barbárie, entre a memória e o esquecimento, entre a justiça e a farsa do perdão.

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