O problema é que esse tipo de polêmica mais atrapalha que ajuda a compreensão do neonazismo no Brasil
Por Wilson de Oliveira Neto,
historiador
Quem chega à cidade de Joinville pela BR-101, no sentido norte-sul, costuma entrar na cidade pelo Pórtico de Joinville, localizado na avenida Brg. Eduardo Gomes, no bairro Glória. Ao lado da construção, que também é conhecida como “Pórtico da Rua XV”, encontra-se o Moinho de Joinville.
Trata-se, de uma atração turística inaugurada em 1982, durante a gestão do prefeito Luiz Henrique da Silveira (1940-2015), inspirado em uma viagem que fez ao norte da Alemanha. Na época, Joinville vivia um contexto de expansão do turismo baseado na exploração de uma representação do seu passado colonial alemão, expresso em uma arquitetura conhecida, genericamente, como “falso histórico”.
O Mercado Municipal e o Moinho em questão são exemplos marcantes desse tipo de política turística com doses cavalares de anacronismo e caricatura de uma suposta herança cultural alemã existente na cidade.
Iluminadas
Redes sociais – Desde o último dia 16 de outubro, o moinho passou a ter suas hélices iluminadas, inclusive, quando movimentadas. Segundo matéria na imprensa, a iniciativa foi da cervejaria responsável pela atração. Contudo, não levou muito tempo para as hélices iluminadas serem vistas como uma enorme suástica, símbolo do Nazismo, movimento-regime político que existiu na Alemanha entre 1919 e 1945.
No palco das redes sociais, alternaram-se comentários duvidosos denunciando a tal suástica, bem como impropérios contra seus autores, rotulados como “burros”, “desocupados” e mesmo “invejosos”. Em âmbito político, foram requentados os discursos de prejuízo para a imagem de Joinville e de negar a possibilidade de existir na cidade “práticas nazistas”.
“Delírio delirante”
Brega – “Delírio delirante”, diria o dinobot Slag. Pois, é muita ginástica visual enxergar uma suástica ou qualquer outra referência ao nacional-socialismo nas hélices do Moinho. Sim, a edificação é brega e, como dizia o meu avô, que não gostava do lugar, “coisa para turista”. Porém, novamente, procura-se pelo em casca de ovo.
Eu não nego a existência de neonazismo em Santa Catarina e Joinville. Aliás, faz um tempo que a Polícia Civil desbaratou uma célula Neonazista no estado com integrantes em Joinville, conforme amplamente noticiado pela imprensa. Durante a década de 1930, existiu na cidade um grupo local do então NSDAP, parte da Landesgruppe Brasilien, a maior entidade nazista fora da Alemanha.
Pesquisa científica
Desgaste – O problema é que esse tipo de polêmica mais atrapalha que ajuda a compreensão do neonazismo no Brasil e, principalmente, o seu combate por meio de pesquisa científica, como por exemplo, os trabalhos pioneiros de Adriana Dias (1970-2023), e da investigação policial realizada em Santa Catarina pela Polícia Civil.
Na minha óptica, o pior estrago que esse tipo de besteirol pode causar é o desgaste de um assunto sério entre o público, deslegitimando o trabalho árduo de pessoas e instituições, que há muito tempo lutam contra a reabilitação das ideias e das práticas nazistas, sejam elas no exterior ou mesmo em Santa Catarina.
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